segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Bittersweet Simphony

Quando há Beleza a existir,

que dor importa?

E o que importa passar o rio da vida,

se em páginas brancas é que passa,

como na peneira garimpando ao sol,

e como num ralo para enxurradas,

recolhem-se os escolhos mais auríferos

do rio da vida que passa...

Só há de sobrarem tesouros apenas

em página branca do Céu sentido...

Que me importa, deveras, a mesquinhez e a impotência de mim

se há quem seja, nalguma parte, a nobreza e o poder que amo?

Atormentante a flor que tem o céu tapado...

E não vê, e não se curva, e não vive à sombra luz

da outra flor que saudável vive eterna.

Que zombeteiro deus confundiu os caminhos da Beleza?

Que furioso deus injetou-me o hormônio da ansiedade?

Que poderoso deus projeta os caminhos da minha queda?

O que é que força os sonhos a perderem a doçura na dureza do compromisso

e já se perder em amarras...

Trazer à Terra, ou simplesmente deixar que haja sobre a Terra e o Tempo

a Beleza

de haver tudo o que passa

e de tudo passar tão lindamente...

Antes eu sentia um aríete

varrendo de alegria o caminho até o futuro...

Um trator abrindo o sulco

o caminho até o futuro...

Quando há Beleza a existir

que importa?

Tão leve a presença do Senso...

Tão leve como o pássaro voa...

Tão resumida, essa impressão de Agora...

Passado um dia do dia do passeio

é que o benefício se mostra, acenando com a saudade...

Por que sou triste?

Quem se apaixonou pela Beleza

como pode ser alegre? Antes chora

haver passado... Tudo passando...

Tudo passado...

A soberania do ar...

Quem me dera inclinar francamente a cabeça

à soberania do ar...

à soberania da luz...

Quem me dera ser devoto e entregue

à soberania da luz...

E viver os últimos ainda longos dias

inclinado à luz de todo dia...

Quem me dera deixar tudo

e inclinar-me à luz de todo dia...

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

A LIBERTAÇÃO DOS POETAS


Como a panela que foi destampada,
os poetas correram
a riscar o céu
- ainda na Terra -
como astros,
como átomos,
cometas, ou estrelas,
como moscas minúsculas,
sob o sol da tarde lendária,
e o infinito nunca pareceu tão presente.

Por todas as estradas,
ó, praga!

Os loucos, os vegetais, os vagabundos,
tomaram de assalto o ar nitrogênico
que nos alimenta o dia-dia.

O banquete dos mendigos.
Em cada tufo na longínqua fieira de areias,
algum está tomando o seu farto bocado de sol.

Vagabundos da Terra, voai.
O fogo esquentou-nos, pipocas,
e o Tempo vem nos comer:

quantas avarezas
perdestes,
nesse cozinhar?
FOR THE FIRST TIME


Pela primeira vez, a música.
Pela primeira vez, o raio,
o nunca visto.
Meto-me em caverna,
e o muito conhecido
é contemplado com assombro.
Nada é natural.
Tudo parece sobrenatural.
E tem regozijo,
ao sol,
no final da tempestade.
Os pássaros gorjeiam,
pela primeira vez.
E os livros de ciência
são relatos de lendas
comprováveis.
Nasceu-me uma coisa que se chama "tomate",
no quintal.
E, pela primeira vez,
tenho certeza de que
nunca existi.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

FOR THAT NOW


Anjos abrem nos céu.
Nuvens.
Espaços sem nuvens,
desenhos de símbolos,
hieroglifos, impermanentes.
Azuis,
e o buraco para a lua.
Aquele momento, agora,
é um halo de arco-íris.
Pura.
WU WEI


Não permitas que o teu minuto seja gasto
com outra coisa
que não seja
tu mesmo.
É para si que a rosa nasceu,
e para ti.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

COLOMBO


Os dons da terra,
os vastos mares.
Os doces ferros
imateriais
dos teus braços.
Índias conquistadas, e eu cativo.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

CONVERSANDO SOZINHO


Depois que você partiu,
sobrou-me a sedução do escrever,
do fazer manuscritos de bar,
ou célebres páginas em caligrafia artística,
do século mais que passado,
A sedução do marcar a noite,
num compasso de longas paradas,
longas esperas,
em que te materializas,
e encanta a minha atenção
para assuntos que jamais conversaremos.

Ficam nas entrelinhas
do Esquecimento,
esse deus de nossas reações,
de nossos sentimentos.
JUAN DE ENCINA

As luzes são de papel,
e os fogos são de cartolina,
mas a frágua é verdadeira,
é verdadeira a estima.
O amor é o mais verdadeiro,
o mais eterno.
De dia, a noite se cria,
À noite, o dia.
Só por ter duas moedas,
fiquei rico.
O ouro de seu colar
cobria toda lembrança de frio.
Sol, e rio.
Lembranças do meu jardim.


A Rosa


Mesmo uma pequena oferenda,
em água cristalina,
em copo de vidro,
À rosa.
Surgida na tarde.
Com vindouros ramos.

Só essa pequena parte
já prepara a história.

Quão grande será
só o Vazio de Deus mostra.

É apenas um vazio.

É apenas uma rosa.

E apenas.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

A folha cai,
eu não vi.

Os sonhos caem,
mas ficam dependurados.

O macaco cai
- é hora de aprender
a usar o rabo.

A manga cai
- é a sorte dos marimbondos.

A água cai -
de desilusões são feitos os banhos.

A terra cai,
sobre a semente.

sábado, 1 de outubro de 2011

Faéton


“All the tired horses in the Sun...

I´m supposed to get them, and ride, and run…”

Dylan


E então, Faetonte decidiu cavalgar o Sol

enquanto seu pai se ausentou.

E nunca se viram dias tão sem diligência...

Nunca havia ensolarado na inexistente América...

E, de uma só vez, derreteram-se gelos para haver atlânticos; o sol pulava nas cordilheiras

como em chão esburacado; (dos amortecedores, então,

nem falemos...) Os cavalos de longas nuvens

faziam tanto estrago pelo caminho, que o Sol fazia em chamas as pessoas nas cidades..

Uma confusão dos diabos...

...

Até que Faetonte bateu de frente com o mar..

...

Tudo deslumiu...

...

E por muito tempo houve apenas noite...

Apolo emudecera; a lira estava longe, esquecida;

e ele, calado, retirado em solidão compungida.

...

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E foi assim até o dia

em que as Sereias lhe devolveram, do mar,

o Sol, que haviam reformado..