sexta-feira, 16 de março de 2012

PLANTAS AMBULANTES

O vaso de samambaias foi deixado esperando um ônibus. Foi esquecido ali, na sombra do ponto. Ali ficou, a ver os carros, e a sentir, aos poucos, o benefício da sombra, e imergir em contemplação, mesmo em horário de pico, e só foi perturbada uma vez, quando o ponto ficou bem lotado e esbarravam nela, e a amassavam, mas isso só a mergulhou mais fundo em si mesma, em sua consciência.

Até que uma senhora gostou dela e a levou para casa, visto que ela estava perdida, esquecida ou abandonada. E ficou entre outras, na varanda e garagem.

Até que, enfim, depois de ter visto muito, de ter presenciado muitas coisas, e participado de muitos eventos, foi presenteada a um neto, que a levou para outra casa, onde ela ficou no parapeito de uma janela muito alta, a contemplar, de longe, as luzes da cidade, quando a noite caía, e a aragem a mexia.

Todas as vicissitudes dessa planta culminaram com uma criança que a pegou para brincar. Foi muito divertido, para as raízes, que se sentiram podadas para renascer. A planta ficou irreconhecível, e foi jogada como morta, num lixão onde as raízes, tristemente, pereceram, por falta de um senso de caridade, dos homens.

Os vasos são plantas ambulantes. Como este mundo está moderno!

Tudo por obra do homem, que muda as pedras de lugar. E as plantas.

Outros vasos têm outras aventuras. Alguns chegam a atingir 50 anos de idade, o que nos faz pensar que os 60 anos regulamentares do homem são suficientes para uma vida boa. Mais do que suficientes.

Alguns vasos duram mais, outros duram menos. Isso depende de muita coisa. Depende das condições em que se formou a semente; depende do cuidado humano, depende das condições climáticas. A grande alegria de todo vaso é a de ter atingido a vida plena, seja morrendo aos 3 ou aos 65 anos de idade.

Assim, o homem.


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